terça-feira, 10 de maio de 2011

Histórias que a guerra não é capaz de destruir

Os livros em quadrinhos de Joe Sacco são ótimos para quem quer começar a entender os Bálcãs e, mais precisamente, a Bósnia. Mas há também ótimas publicações em formato convencional que dão conta da difícil tarefa de falar de uma região tão complexa. E o livro "Da Rosa ao Pó – Histórias da Bósnia Pós-genocídio", do jornalista Gustavo Silva, certamente está entre elas.


Com uma inusitada apresentação de Marcelo Adnet – já comentada no post anterior deste blog –, a obra é o resultado da viagem feita pelo autor em 2009 para conhecer, com os próprios olhos, o país que foi palco do maior genocídio em solo europeu após a Segunda Guerra Mundial, o massacre de Srebrenica (11 de julho de 1995).



O embrião do livro, como o autor explica logo nas primeiras páginas, foi a prisão de Radovan Karadzic, ex-presidente da república sérvia da Bósnia e um dos responsáveis pelo banho de sangue em Srebrenica, em 21 de julho de 2008. Mas o foco central da obra é a Marcha da Paz, realizada anualmente em memória às vítimas do episódio, e da qual o autor tomou conhecimento apenas quando já estava na antiga república iugoslava. Dessa mistura de sorte com senso de oportunidade saiu o grande diferencial do livro – Gustavo foi, segundo os organizadores do evento, o primeiro brasileiro a participar da marcha.

Por meio dos depoimentos presentes no livro é possível ter uma ideia da situação atual do país, das marcas deixadas pela guerra que se seguiu à declaração de independência da Bósnia (1992-1995) e em especial pelo massacre que tirou a vida de cerca de 8 mil pessoas.

Pelo caminho descrito por Gustavo Silva percebe-se a forte presença tanto da rosa (vida, belezas naturais, sobreviventes da guerra, entre outros aspectos) como do pó (marcas de tiros nas construções, alertas sobre minas de guerra, relatos de intolerância étnica), justificando assim o nome da publicação.

O lado didático do livro fica por conta dos boxes que trazem explicações sobre curiosidades da Bósnia, como a pronúncia do idioma, da culinária e de aspectos históricos do país. Outra característica interessante são os trechos de canções da The Rolling Stones, uma das preferidas de Gustavo Silva, no começo de cada capítulo. A obra se encarrega de mostrar o porquê de serem citadas.

A experiência do então estudante de jornalismo da PUC-SP na Bósnia passou de Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado em 2009, para o livro que agora chega às livrarias brasileiras pela editora Tinta Negra. Uma publicação que consegue, mesmo abordando um tema pesado, trazer histórias que levam o leitor a refletir sobre como tal carnificina foi possível. Mas também demonstra que nem mesmo a guerra foi capaz de abafar a gentileza, onde as pequenas alegrias brotam lado a lado com as lembranças do terror – e que certamente ajudam a suportá-las.

Para quem deseja saber um pouco mais sobre o autor pode ler a entrevista que ele concedeu a este blog em julho do ano passado, às vésperas do aniversário de 15 anos do massacre de Srebrenica.

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