sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Rússia, entre quedas e ascensões

“Nós realmente acreditávamos na palavra mágica e bela, a democracia. Mas muitas coisas não saíram exatamente como esperávamos. Nós começamos a nos perguntar pelo que derramamos nosso sangue.”, diz o russo Serguey Veretelny em entrevista ao diário New York times, dos EUA. E a fala deste cidadão é emblemática para entender o dilmea vivido hoje pela Rússia.

Maior e mais importante das ex-repúblicas soviéticas, a Rússia viveu o mesmo problema que os antigos países do bloco socialista ao sofrer seu “choque de capitalismo” – aumento da desigualdade social, desemprego, abertura do mercado, privatizações em massa e falência de companhias nacionais, entre outros.
A outrora superpotência que rivalizava com os EUA parecia motivo de piada pelo mundo – com direito a algumas performances vexatórias do presidente Boris Ieltsin regadas a vodka. A crise que atingiu a economia russa em 1998, que derrubou a cotação do rublo, e o afundamento do submarino Kursk em 2000 foram símbolos da decadência, de um gigante caído. Esse caldo contribuiu para deixar um sentimento de saudosismo no ar, levando parte da sociedade a preferir o período soviético, mesmo que a custo da restrição de liberdades como a de expressão e de imprensa.

Um dos grandes méritos de Vladimir Putin – que assumiu o poder em 1999, no lugar de Ieltsin –  foi justamente o de recuperar parte do orgulho perdido pós-1991. Ele ainda teve de arcar com o ônus do naufrágio do Kursk, mas foi a partir desse caso que o ex-espião da KGB literalmente colocou a Rússia sob suas rédeas, para o bem e para o mal. A tragédia com o submarino, em 2000, no qual começou sendo atacado, terminou com Putin controlando de forma direta ou indireta grande parte da mídia e da economia. Contou ainda com a alta cotação do petróleo e do gás no mercado internacional, recursos abundantes no solo russo – e que se tornaram instrumento de pressão geopolítica de Moscou.

Putin deixou a presidência em 2008, mas lá deixou o apadrinhado político Medvedev e virou premiê. Para 2012, pretende voltar ao cargo que deixou formalmente quatro anos atrás – mas do qual na prática nunca saiu por completo, tornando-se uma espécie de neoczar.

Para o ex-líder soviético Mikhail Gorbatchov, Putin fez a Rússia “andar para trás” nos últimos anos no que diz respeito à democracia e liberdade. Mas diz manter a fé de que a democracia vai prevalecer no país.
“O que me preocupa é o que o partido Rússia Unida, de Putin, e o governo estão fazendo. Eles querem preservar o status quo. Não há avanço. Pelo contrário, eles estão nos puxando para o passado, enquanto o país está precisando urgentemente de modernização. Algumas vezes, o partido da Rússia Unida me lembra o antigo Partido Comunista Soviético”, diz Gorbatchov em entrevista à revista alemã Der Spiegel. O ex-lider, no entanto, não esconde que já apoiou Putin no passado.

Apesar de o partido do governo ter perdido espaço no setor legislativo e dos protestos pelas principais cidades russas – que apontavam existência de fraudes no sistema eleitoral –, a oposição ao governo Medvedev ainda é muito deficiente e tampouco deve ter chances de impedir que o antecessor e atual primeiro-ministro chegue à Presidência pela terceira vez.

Seja Putin ou qualquer outro que assumir o Kremlin em 2012, o futuro governante terá diante de si uma Rússia cada vez mais em evidência – recém-admitida na OMC, é a letra R dos Brics (grupo dos principais países emergentes do globo), sede dos Jogos de Inverno (2014) e da Copa do Mundo (2018), entre outros eventos. A maior exposição do país no cenário internacional, no entanto, pode ser usada pela oposição como forma de pressionar o governo por reformas, reivindicações e para construir um verdadeiro debate político na Rússia. A sociedade, mesmo que descrente dos rumos do país, agradece. 

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